Frutos Velhos II

02:27

Já vejo no escuro. Olho com os olhos semicerrados os olhos de quem me olha. Arrasto-me e tacteio o chão, talvez paredes, uma porta, um pau ardente (talvez apenas folhas e um filtro). Cabrões dos nervos, malditas tremuras,  rascas as gerações - as deles, porque a minha é intemporal. Sirvo-me de cuspidelas inúteis e nelas vão carne, minha, que arranco das próprias mãos, não com as mãos mas com o dentes - unhas da boca - umas vezes para fora, outras para dentro. Não tenho sons que me estimulem a raiva, e tanto preciso eu que me arranquem os cabelos para não arrancar  os dedos, ou dos maços os fumos incoerentes.

Tenho todos os males que possam cair sobre um mortal - de imortais falem os que de si souberem - e vejo-me de olhos arregalados. A mão partida em qualquer insignificante lugar, o joelho triturado por anos de humidade, o calcanhar com medo do resto do pé, o resto do pé com trauma de infância (outro qualquer seria demasiado simples para mim) e não durmo. Já não. Nunca mais.

Mas vejo no escuro. Lanço sobre mim feitiços em que não acredito, e o querer nunca supera o seu irmão, mas a vontade de rematar um estigma sobre mim sobrepõe-se. Ingiro plantas do limbo, ou que para lá me levam, arregaço as mangas e caio de frente. Aí já não sou eu.

André F.

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